sexta-feira, 17 de agosto de 2012

Resenha crítica: "Cinco Lições de Psicanálise"


     O objeto de estudo da psicanálise já é extremamente controverso: a mente, e não bastasse ter um objeto de estudo tão “polêmico” a psicanálise também é preferencialmente criticada por muitos leigos em função de seus recursos de estudo utilizados (métodos de introspecção, conseguida, por exemplo, pela prática da hipnose) e resultantes deles suas prováveis deduções acerca dos fenômenos observados.
     Um ponto tentador para uma possível “briga intelectual” seria na própria crença de um sujeito governante e, por isso, dotado de consciência, ainda que no conteúdo mental habitasse níveis de inconsciência os quais influenciariam grandemente nas ações do indivíduo. Em função dessa capacidade “especial”, Freud entendia a mente como sendo o espaço de estudo ideal para a compreensão do comportamento, mas os Behavioristas (pelo menos os do início do movimento behaviorista), ao contrário, não deram crédito ao estudo da mente em si, justamente pelo seu caráter muito subjetivo, indo de encontro à objetividade buscada pela ainda incipiente ciência psicológica moderna.
     Outro ponto muito atrativo para iniciar discussões é o próprio conceito de inconsciência: haveria na mente um espaço, ordenação ou níveis de consciência (inconsciente, subconsciente, consciente)? É importante frisar isso, porque toda a teoria psicanalítica de Freud estabelece todas suas deduções com base nessa crença. Veja-se, por exemplo, os sintomas de histeria, os quais, segundo Freud, estariam ligados a traumas psíquicos guardados em “baús” mentais, e que por razões estranhíssimas se faziam revelar inesperadamente.
     Este conceito de níveis de consciência, mesmo não apresentando uma comprovação experimental de sua facticidade, evidenciou um elemento muito interessante à compreensão da ordem humana: a existência de fatores internos os quais influenciam substancialmente a ordem de nossas ações, sem que possamos controlá-las voluntariamente. E este se constitui um importante contraponto ao pensamento racionalista reinante até então, de autonomia das ações humanas.
     Atualmente muitos concordam e a psicologia evolucionista embasa essa tese de que nossas ações são autônomas, mas não “ad finitum”, antes sendo limitadas não só por fatores físicos, mas também ambientais. Defender uma mente separada e, por assim ser, independente, como acreditava Descartes, que se percebe quando tentou separar o ser em “coisa pensante” ou res cogitans e “coisa extensa” ou res extensa, nos dias de hoje é inconcebível, tendo em vista todas as evidências de uma atividade muito mais tautológica das funções mentais e corporais, se é que se pode separar, e delas com o ambiente.
     Mas ao ler pela primeira vez um escrito de Freud, embora de conteúdo resumido e sucinto, confesso que tive dificuldade de acreditar em muitas linhas de raciocínio propostas pelo autor. E não associo isso ao estilo literário utilizado, antes às próprias inferências tomadas. Explico melhor: o estudo de um fenômeno inicia-se com a observação, e em cima do que foi observado elaboram-se hipóteses acerca do observado,  intencionando obter a veracidade da hipótese criam-se mecanismos de análise, com os quais se torna possível comprovar ou refutar a hipótese levantada. Se comprovada, a conclusão do processo torna-se uma teoria.
     Pois bem, caso alguma etapa desse método (científico) for defeituosa teremos uma teoria macabra, assim como a que me lembra da teoria da abiogênese, na qual os ratos habitantes dos lixões seriam não só moradores de lá, mas gerados do lixo, literalmente. O que me leva a perguntar acerca dos métodos psicanalíticos freudianos: eles são coerentes? Suas inferências são apropriadas? De qual ponto de apoio epistemológico nos valemos para que o conhecimento psicanalítico não tracione para a “doxa científica”?
     Apesar desses possíveis “buracos” epistemológicos e metodológicos, Freud com certeza tem o seu mérito ao tratar de um tema não só revolucionário e polêmico, mas inovador e incrementador de novos conceitos e novas discussões para a ciência psicológica.

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