quinta-feira, 1 de novembro de 2012

Nódoa na Existência

     Pedir para que um adulto pare de pensar mais em si em função de um novo ser    um filho    com certeza é pedir muito de alguém o qual também quer viver, quer sentir-se livre. Mas é igualmente cruel cobrar de seus filhos que cresçam antes do tempo e tornem-se logo adultos. Cobrar que sejam autônomos para poderem o quanto antes se virarem sozinhos e, quem sabe, até os ajudar financeiramente, assumindo suas contas.
     Os bons observadores perceberão o porquê desta minha posição argumentativa, basta ter um pouco de empatia: fui cobrado muito cedo por respostas, responsabilidades. Fui estigmatizado pela espera de um grande futuro    promissor, brilhante. E por isso tinha muito medo do futuro e de suas incertezas, ou melhor, das represálias de não concretizá-lo. E lentamente minha infância e adolescência foram se tornando num chão cada vez mais movediço, num pântano insalubre e sem vida.
     Não provei certamente as agonias de passar fome... Céus! Deve mesmo ser horrível! Também não precisei "vestir-me de sol" por me faltarem roupas, não cresci burro. Mas não era uma pessoa feliz. Me chamem de ingrato, mimado, do que quiserem, mas não tinha jamais paz de espírito! Cresci cercado de terrores, fantasmas invisíveis, e que, diferentes daqueles de filmes, podia vê-los todos os dias a perturbar-me.
     Hoje sou capaz de notar: todo o suor, e todos aqueles ovos engolidos crus a fim de saciar a fome de uma pobre operária nordestina, que abraçara o mundo, rumo ao "Sul Maravilha", numa tentativa desesperada de viver uma vida melhor e oferecer melhores condições para seus pais, irmãos e um filho, fruto de uma ironia do destino!
     Mas não pude enxergar isso quando era criança. Não pude ver todo o esforço para suprir meu corpo de suas necessidades. Não pude entender as desgraças da vida, não via suor, nem ovos, nem cansaço, via apenas maldição. Maldição na minha vida, no meu caminho. Quem sabe não fosse "Deus" fustigando minha vida, assim como fez com Jó? A vida de uma criança que não sabe reconhecer a miserável sorte que tem?
     Meu corpo está todo marcado com essas feridas que o tempo, apesar de tudo, cuidou de dar algum sentido, tentando cicatrizá-las...

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